NOTA DE PESAR E INDIGNAÇÃO

Foi com grande consternação e pesar que o corpo docente, discente e administrativo do Instituto de Pesquisas Afro-Latino-Americanas, do Hutchins Center, na Universidade de Harvard (ALARI), tomou conhecimento no dia de hoje do brutal assassinato da Mãe Maria Bernadete Pacífico, liderança quilombola da comunidade Pitanga dos Palmares e da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombola (Conaq). Mãe Bernadete foi alvejada a tiros dentro de sua casa, em crime brutal que alude ao que se passou há seis anos com seu filho, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos (Binho do Quilombo), também liderança quilombola da comunidade Pitanga dos Palmares.

A perda de Mãe Bernadete traz profunda dor à sua extensa família – de sangue e de santo – e deixa uma lacuna impossível de ser reparada, tanto de afeto, quanto dos saberes que possuía. Tratava-se, por sua luta, relevância pessoal e idade – que é posto – de uma guardiã de saberes ancestrais, ora silenciada. Não apenas, trata-se de mais um corpo negro brutalmente assassinado, à luz do que é praxe na longa e trágica história afro-diaspórica brasileira. Sua perda é sentida por toda a sua família, e pelo ALARI, que tem a Conaq como parceira no Certificado em Estudos Afro-Latino-Americanos.

A trágica morte de Mãe Bernadete, ademais de nos trazer desconsolo, nos chama atenção para a continuada fragilidade em que o corpo negro – e feminino – está submetido em toda a América Afro-Latina. Este continente que foi construído sob sangue escravizado negro e indígena, sob a continuada violação de corpos não brancos, segue sem oferecer condições mínimas de sobrevivência a essas populações. E “se a carne mais barata do mercado é a carne negra”, as vivências mais silenciadas, as memórias mais apagadas, as lutas mais abafadas, são também as afrodescendentes e indígenas. Notamos, em específico, que o Brasil é o país que mais mata ativistas pela terra.[1]

Não há teorias ou conceitos acadêmicos que possam reparar a tragédia dessa e de outras perdas, comuns, históricas e longevas a todo o povo afro-latino-americano. De nossa parte, portanto, manifestamos nossa solidariedade e nos unimos à Conaq e à família de Mãe Bernadete na demanda por justiça e reparação. Enquanto tentam nos silenciar, que nos façamos unidade.


[1] Sobre o assunto, citamos: https://www.conectas.org/noticias/brasil-e-o-pais-que-mais-mata-ativistas-pela-terra-de-acordo-com-relatorio-da-global-witness/